Desde que entrei na faculdade, morei em várias repúblicas diferentes, mistas ou femininas.
A maioria delas eram casas antigas, em que várias gerações de estudantes haviam morado. Uma delas era uma das repúblicas mais antigas da cidade embora já tivesse mudado de casa diversas vezes, mas sempre mantendo a tradição republicana.

A última casa era bastante antiga, com forro de madeira e grandes janelas nos cômodos. A janela da cozinha era grande e dava para um corredor que levava a uma pequena varanda, com uma escada, e esta levava ao quintal.
Da porta da cozinha, que ficava ao lado da janela, se via pela metade a parede da pequena varanda, onde se encostava uma mesinha de bar, e uma parte de um painel de recados onde eram afixadas fotos e textos.
A janela e a porta, não importava quando, ficavam sempre abertas, e como de costume nos fins de semana todo mundo ia viajar, menos um colega da pós-graduação e eu, sendo que éramos em 4 na casa.

Num domingo, estávamos sem fazer nada no meio do dia, sentados na mesa da cozinha conversando, meu amigo sentado na cabeceira da mesa e eu sentada de frente para a tal porta e a tal janela, de tal modo que nós dois podíamos ver razoavelmente bem o que se passava do lado de fora.

Estávamos já esperando um dos nossos colegas voltar de viagem, já que ele prometera voltar à tarde, e seu quarto era no fundo do quintal, sendo que para chegar nele, ele deveria passar pelo corredor e pela varanda obrigatoriamente.
Vimos então alguém passar pela janela, mas só deu pra ver um pedaço da cabeça e dos ombros, mesmo porque não estávamos prestando muita atenção.

Pensamos: "nosso amigo chegou!" e esperamos que ele fosse entrar pela porta da cozinha. Mas então ele foi até o quadro de recados, que nós víamos mais ou menos, e afixou algo. Imaginamos que fosse alguma foto engraçada, mas não atinamos para o fato de que não se dava para distinguir ou reconhecer o nosso amigo naquela figura que passara também pela porta, e seguira então para o seu quarto.

Ficamos esperando, e ele não entrava. É bom lembrar que não tinha outra entrada ou saída daquele local senão pelo tal corredor, e mesmo que ele preferisse entrar pela porta da frente, teria de passar pelo mesmo corredor e nós, com certeza, o veríamos.
Fui então até o quintal e verifiquei o quarto, varanda, corredor, etc, e não havia ninguém.

Sentamos de novo no mesmo lugar da mesa da cozinha e nos entreolhamos assustados.
No quadro de avisos, não havia nada diferente. e então, enquanto pensávamos, atônitos, num tipo de brincadeira de mau gosto, ouvimos um carro chegar na porta: era o nosso amigo ACABANDO DE CHEGAR COM SEUS PAIS À PORTA DA REPÚBLICA.

Ele não tinha nem passado lá antes. E o mais estranho, ele entrou falando alto, sorrindo e contando, todo animado:

"Cara, vocês não saem mesmo da minha cabeça! Eu até sonhei com a república essa noite, tive um pesadelo engraçado!
Nós estávamos sentados na mesa da cozinha e aí um vulto passou pela janela e pela porta, cara, foi assustador!".

Ele ria. Até que, quando viu a nossa cara branca como papel e nós contamos o que tínhamos acabado de ver, ele também juntou-se aos pasmos e assustados, jurando, de pés juntos, que não dormiria mais no quarto dos fundos, onde ficava isolado do resto da casa.

Quem ou o que seria aquele visitante misterioso que passou pelo local, e colocou alguma mensagem "invisível" no quadro?
Seria o fantasma de um antigo morador que ficou preso à aquela antiga República Estudantil devido à lembranças de um passado remoto?

 


 

 

 

 


O MISTERIOSO COLEGA
DE REPÚBLICA

Carol - Rio Claro - S.P.
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